Em meio à intensificação da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, os reflexos já começam a ser sentidos diretamente no agronegócio brasileiro. A China, principal compradora de soja do mundo, acelerou de forma significativa a aquisição do grão brasileiro, numa tentativa de se proteger da produção americana, que pode ser impactada pelas novas tarifas anunciadas por Washington.

Nesta semana, segundo a agência Bloomberg, o gigante asiático comprou uma “quantidade incomumente grande” de soja do Brasil. Foram contratadas pelo menos 2,4 milhões de toneladas apenas no início da semana — volume que representa quase um terço do que a China costuma processar mensalmente.

A movimentação é vista como uma resposta imediata à escalada das tensões comerciais entre os EUA e a China, e acende o sinal de alerta para o mercado global de commodities. Apesar do Brasil já ser o maior exportador de soja para a China — com os EUA em segundo lugar —, a nova rodada de tarifas pode provocar um redesenho temporário nas rotas de comércio internacional do grão.

Demanda aquecida, mas com limitações

A busca acelerada pela soja brasileira representa uma tentativa da China de diversificar seus fornecedores e reduzir sua dependência da soja americana. No entanto, especialistas alertam que essa substituição total é improvável devido ao ciclo produtivo das lavouras.

Enquanto a soja brasileira é colhida no primeiro semestre do ano, a produção americana entra no mercado no segundo semestre, o que historicamente garante a alternância de abastecimento entre os dois países. Ou seja, o Brasil pode ganhar mais espaço no curto prazo, mas ainda é cedo para afirmar se a mudança terá impacto permanente.

Colheita em ritmo acelerado

De acordo com dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), 85% da safra 2024/25 de soja já foi colhida no Brasil até o último levantamento feito em 6 de abril. Estados como Mato Grosso já encerraram praticamente todo o processo (99,5%), enquanto o Rio Grande do Sul, afetado por questões climáticas, colheu apenas 35% até agora.

O Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) já havia sinalizado, na semana passada, um avanço nas negociações no mercado spot, impulsionado pela valorização do dólar frente ao real, o que torna a commodity mais competitiva para exportação.

Além disso, muitos produtores têm vendido parte da safra para levantar recursos que permitam custear o plantio da próxima temporada, o que também aquece o mercado.

Exportações em alta

Segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex), o Brasil exportou 10,25 milhões de toneladas de soja até 21 de março, um crescimento de 59,5% em relação a fevereiro. A média diária de embarques no período foi 25,2% superior à do mesmo mês em 2024.

Esses números consolidam o país como peça-chave no tabuleiro global da soja, especialmente em momentos de instabilidade geopolítica como o atual.

Perspectivas e cautela

Embora o movimento atual represente um impulso para o setor agrícola brasileiro, analistas recomendam cautela. A guerra comercial entre Estados Unidos e China é marcada por reviravoltas e recuos repentinos, o que pode impactar o cenário rapidamente. Além disso, o desempenho das lavouras norte-americanas no segundo semestre será crucial para definir o comportamento da demanda global.

Ainda assim, o Brasil demonstra estar bem-posicionado para aproveitar o momento e fortalecer sua posição como líder global na exportação de soja.