
Enquanto o governo brasileiro tenta aprovar medidas para taxar os super-ricos e equilibrar as contas públicas, dados internacionais mostram que o país é significativamente mais permissivo com grandes fortunas do que nações desenvolvidas. A alíquota máxima do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) no Brasil é de 27,5%. Nos Estados Unidos, por exemplo, a alíquota federal chega a 37% — sem contar tributos estaduais —, e na Noruega ultrapassa 50%, somando contribuições de renda e previdência.
Além da alíquota mais baixa, o Brasil ainda isenta os dividendos recebidos por acionistas de empresas, prática rara no mundo. Segundo estudo da Tax Justice Network (2023), o Brasil é um dos cinco países mais generosos com os muito ricos, devido à ausência de imposto sobre distribuição de lucros e ganhos de capital.
Em países como a Noruega, além de taxar dividendos, há um imposto sobre grandes fortunas, que pode chegar a 1,1% ao ano sobre o patrimônio líquido. No Reino Unido, as maiores rendas são taxadas em até 45%, e nos Estados Unidos, a taxação pode ser ainda mais alta se considerados os impostos estaduais, como na Califórnia, onde a carga total chega a 52% para os mais ricos.
Governo quer taxar quem ganha mais de R$ 1,2 milhão por ano em dividendos
No Brasil, a proposta mais avançada para aumentar a justiça fiscal entre ricos e pobres prevê a cobrança de uma alíquota de 15% sobre dividendos superiores a R$ 1,2 milhão por ano. A medida, segundo o governo federal, afetaria apenas 0,1% da população. A isenção atual, criticada por especialistas, faz com que um trabalhador com renda salarial pague proporcionalmente mais impostos do que um acionista que recebe milhões em lucros distribuídos.
Estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta que a carga tributária sobre os mais ricos no Brasil está entre as menores do mundo, enquanto os impostos sobre consumo pesam proporcionalmente mais sobre os mais pobres.
A ideia de que os ricos “fogem” quando há mais impostos é um mito
Um argumento recorrente contra o aumento da taxação sobre os mais ricos é o risco de fuga de capitais. No entanto, estudos conduzidos pela London School of Economics e pela Universidade da Califórnia demonstram que esse temor é infundado. Um dos levantamentos, realizado nos Estados Unidos, analisou a migração de milionários entre estados com diferentes cargas tributárias e concluiu que a maioria dos super-ricos permanece onde vive, mesmo com aumento de impostos.
Segundo o site Inequality.org, fatores como estabilidade política, segurança jurídica, oportunidades de negócios e laços familiares pesam mais que a carga tributária na decisão de permanência. Outro estudo publicado pela Center on Budget and Policy Priorities mostrou que a arrecadação extra com o aumento de tributos sobre os mais ricos supera qualquer eventual perda por evasão.
Caminho para uma reforma mais justa
Economistas e organizações internacionais têm defendido que o Brasil siga o exemplo de países como Alemanha, França, Canadá e Noruega, onde a carga tributária sobre as maiores rendas financia robustos sistemas públicos de saúde, educação e previdência. A tributação progressiva é, segundo a OCDE, um dos pilares para a redução da desigualdade.
A proposta de taxar os super-ricos no Brasil integra a Medida Provisória 1300/2025, que também introduz alterações na estrutura de impostos sobre aplicações financeiras. O governo estima arrecadar R$ 54 bilhões em quatro anos com a medida. A Câmara dos Deputados e o Senado Federal têm até setembro para aprová-la. Se não for votada, a proposta perderá validade.
Para especialistas, a resistência política à aprovação é impulsionada por um sistema que ainda protege os interesses de uma minoria poderosa, enquanto a maioria da população brasileira segue arcando com a maior parte da carga tributária por meio de impostos indiretos, como o ICMS sobre alimentos e energia elétrica.
O debate sobre justiça fiscal no Brasil ganha força diante das comparações internacionais. Em um cenário onde os mais pobres pagam proporcionalmente mais, a taxação dos super-ricos surge como medida urgente para reduzir desigualdades, ampliar a capacidade do Estado e garantir financiamento de políticas públicas essenciais. A experiência internacional mostra que taxar os muito ricos não afasta capital, mas fortalece a democracia e o bem-estar coletivo.