Campus da Universidade Federal do Ceará (UFC) em Quixadá.

Mesmo com promessas de recomposição orçamentária, as universidades federais brasileiras continuam operando com recursos abaixo dos níveis registrados nos governos anteriores à pandemia. É o que aponta levantamento do centro de estudos SoU_Ciência, que revela que, sob o atual governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), os valores efetivamente disponíveis para o funcionamento das instituições permanecem inferiores aos praticados entre 2016 e 2019.

O orçamento discricionário — que cobre despesas como contas de água, energia, limpeza, segurança, manutenção predial e materiais — ainda está distante do patamar necessário para garantir o pleno funcionamento das universidades. O valor também inclui benefícios como auxílio-alimentação e transporte dos servidores, mas, excluindo essa assistência, os números caem significativamente.

Em 2016, o valor liquidado pelas reitorias foi de R$ 6,7 bilhões (ajustado pela inflação). Em 2019, caiu para R$ 5,5 bilhões. Após as reduções durante a pandemia — R$ 4,7 bilhões em 2020 e R$ 3,5 bilhões em 2021 —, houve uma leve recuperação: R$ 4 bilhões em 2022, R$ 5,2 bilhões em 2023 e R$ 5 bilhões neste ano.

Repasses fracionados e incerteza orçamentária

Segundo especialistas, a recomposição promovida pelo governo Lula é insuficiente. Para Weber Tavares, pesquisador do SoU_Ciência e ex-coordenador de orçamento do MEC, o avanço existe, mas ocorre de forma lenta e sem a previsibilidade necessária.

Neste ano, o cenário se agravou com o decreto presidencial 12.448, de abril, que fracionou os repasses discricionários em 18 partes, com previsão de liberação de apenas 61% até novembro. O restante foi prometido para dezembro, o que dificulta o planejamento das universidades.

Em nota, a Andifes, associação que representa as 69 universidades federais, afirma que os cortes acumulados ao longo dos anos continuam gerando impactos significativos, mesmo diante de recomposições recentes feitas pelo MEC.

Infraestrutura sucateada

Além da verba de custeio, os investimentos em infraestrutura e aquisição de bens permanentes também estão em patamar crítico. Em 2024, os gastos para construção de prédios, compra de veículos e laboratórios somam R$ 162 milhões — o segundo menor valor desde 2000.

A crise estrutural afeta inclusive a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), a mais antiga do país, que tem enfrentado cancelamentos de aulas por falta de condições em salas e corredores. Obras estão paradas por falta de verba.

Em 2023, o governo chegou a anunciar um pacote de R$ 5,5 bilhões para as universidades, mas apenas R$ 250 milhões representavam recursos realmente novos — o restante já estava previsto anteriormente.

Assistência estudantil também abaixo do ideal

Mesmo com crescimento recente, os investimentos em assistência estudantil — destinados ao apoio de alunos de baixa renda com alimentação, moradia e transporte — ainda não atingem os níveis de 2016.

O programa PNAES, criado em 2008, chegou a executar R$ 1,2 bilhão em 2016. Após uma queda drástica em 2021 (R$ 881 milhões), os valores voltaram a crescer, mas permanecem abaixo do necessário, especialmente se considerado o aumento no número de matrículas. Em 2023, havia 1,3 milhão de estudantes nas federais, contra 1 milhão em 2015.

O que diz o governo

O Ministério da Educação afirmou, em nota, que o orçamento da pasta teve aumento de 38% entre 2022 e 2025, com previsão de R$ 226,4 bilhões no próximo ano. Segundo o MEC, houve aumento de 22% nos repasses às universidades federais desde o início do atual governo e há um esforço para recompor os cortes realizados entre 2016 e 2022.

A pasta também reconhece que a Lei Orçamentária aprovada no Congresso em 2024 impôs limitações, mas promete garantir uma recomposição mais robusta para 2025.

Para a professora Mariana Almeida, da fundação Tide Setubal e do Insper, é necessário que o governo defina metas claras. “Não basta aumentar o orçamento. É preciso saber quanto é o suficiente e qual é o plano para as universidades: crescer em matrículas ou investir em qualidade?”, questiona.