O primeiro brasileiro a participar de um conclave no Vaticano era nordestino, de origem indígena, e entrou para a história como uma das figuras mais emblemáticas da Igreja Católica no Brasil. Trata-se do pernambucano Joaquim Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti (1850–1930), mais conhecido como cardeal Arcoverde.
Nomeado cardeal em 1905, ele participou do conclave que ocorreu entre os dias 31 de agosto e 3 de setembro de 1914, em Roma. A reunião de cardeais resultou na eleição do italiano Giacomo della Chiesa, que assumiu o trono papal sob o nome de Bento XV, após a morte do papa Pio X. Arcoverde foi o primeiro latino-americano a integrar o colégio cardinalício da Igreja Católica, marcando também a estreia de um religioso brasileiro nesse processo eleitoral reservado à cúpula eclesiástica mundial.
Ligação direta entre o Brasil e Roma
À época, o feito gerou grande comoção nacional. Embora não fosse considerado um papável pela imprensa internacional, Arcoverde simbolizava, para os brasileiros, a esperança de uma representação mais próxima no centro do poder da Igreja. Em 21 de agosto de 1914, o Jornal do Recife destacava com orgulho: “O cardeal Arcoverde concorrerá às eleições para a sucessão.”
A viagem ao conclave não foi simples. O cardeal se encontrava na Europa em uma viagem de recreio quando soube da morte do papa e se dirigiu imediatamente a Roma. Fontes da época relatam que ele tomou um trem da Espanha até o Vaticano e conseguiu chegar a tempo de participar do processo.
No conclave seguinte, em 1922, que elegeu o papa Pio XI, Arcoverde não participou devido à sua frágil condição de saúde, respeitando orientações médicas.

Uma trajetória moldada desde a juventude
Joaquim Arcoverde nasceu em 1850, na cidade de Cimbres — atual Pesqueira — no interior de Pernambuco. Desde cedo, ingressou na formação religiosa, estudando em Cajazeiras (PB) e depois em Roma, onde se ordenou padre aos 24 anos. Morou ainda por Paris antes de retornar ao Brasil.
O sobrenome “Arcoverde” é uma homenagem à avó materna, uma indígena da etnia tabajara, filha de um cacique. A origem reforça sua ligação com a diversidade cultural e social brasileira.
De volta ao país, lecionou no seminário de Olinda e, posteriormente, foi nomeado bispo da diocese de Goiás, cargo do qual renunciou. Atuou como bispo auxiliar em São Paulo, e, com a morte do titular da arquidiocese, assumiu o comando da Igreja paulista.
Seu trabalho ganhou notoriedade pela dedicação à evangelização católica em regiões interioranas e à expansão da presença da igreja em áreas urbanas. Em 1897, foi nomeado arcebispo do Rio de Janeiro, e, em 1905, recebeu o título de cardeal, tornando-se o primeiro brasileiro e um dos primeiros não europeus a integrar o colégio cardinalício.
A política o levou ao cardinalato
A escolha de Arcoverde como cardeal foi também resultado de articulações políticas entre o governo brasileiro e o Vaticano. No final do período imperial e início da República, o Estado buscava demonstrar prestígio no cenário ocidental, enquanto a Santa Sé via no Brasil um parceiro estratégico no fortalecimento da fé católica na América Latina.
Durante seu ministério, Arcoverde contribuiu para a reaproximação entre a Igreja e o Estado após a separação entre poderes instituída com a Proclamação da República. Ajudou a consolidar o catolicismo como força social ativa e mobilizadora, tendo papel importante na oficialização de Nossa Senhora Aparecida como padroeira do Brasil e no apoio à construção da estátua do Cristo Redentor, inaugurada em 1931, um ano após sua morte.
Faleceu em 1930, aos 79 anos, deixando um legado de relevância para a Igreja Católica no Brasil e na América Latina.