A mais recente pesquisa Genial/Quaest, divulgada nesta quarta-feira (2), escancara o cenário de confronto entre o governo Lula e a maioria dos deputados federais, especialmente em temas ligados à justiça fiscal. Dos 203 parlamentares ouvidos — o equivalente a 40% da Câmara — mais da metade (53%) se opõe ao projeto do governo que visa eliminar os chamados supersalários no serviço público, demonstrando forte resistência à agenda de cortes nos altos vencimentos do funcionalismo.

Embora o teto do funcionalismo público seja de R$ 46.366 mensais, muitas remunerações ultrapassam esse valor por meio de gratificações e penduricalhos legais. Não é incomum que alguns cargos públicos paguem mais de R$ 100 mil por mês. A proposta do Planalto busca justamente pôr fim a esses mecanismos, limitando os ganhos às faixas previstas em lei. Ainda assim, a rejeição à medida é superior ao apoio: apenas 32% dos deputados são favoráveis ao corte de supersalários, enquanto 15% preferiram não opinar.

Salário mínimo no centro do impasse

Outro ponto sensível envolve a política de valorização do salário mínimo. O estudo revela que uma parcela expressiva do Congresso não demonstra disposição para ampliar os reajustes do piso nacional, nem mesmo para preservar seu poder de compra. Segundo a pesquisa, propostas para travar aumentos do mínimo ou vincular o valor apenas à inflação contam com significativa simpatia entre os parlamentares mais alinhados ao mercado ou à oposição.

Esse comportamento evidencia o distanciamento entre o discurso de justiça social defendido pelo Executivo e a realidade do Congresso. Enquanto o governo Lula busca reforçar a distribuição de renda, parte majoritária da Câmara prioriza a contenção de gastos — ainda que isso represente congelamento de salários da base trabalhadora e manutenção de privilégios do topo.

Rejeição a jornada menor e à regulação do Judiciário

A resistência ao pacote social e trabalhista do governo se reflete também em outras pautas. A proposta da deputada Erika Hilton (Psol-SP), que prevê uma jornada semanal de quatro dias, foi rejeitada por 70% dos deputados, especialmente entre os oposicionistas (92%). Já o projeto que impõe limites à expansão orçamentária do Judiciário também sofre resistência: 70% dos parlamentares não concordam com a exclusão da magistratura das regras de teto de gastos.

Congresso mais hostil ao governo Lula

O levantamento indica ainda um aumento na desaprovação ao governo Lula entre os deputados. A avaliação negativa subiu para 46% — o maior índice desde o início do terceiro mandato. A aprovação caiu para 27%. Entre os independentes, a queda foi acentuada: a aprovação passou de 18% para 8%, e a desaprovação saltou de 20% para 44%.

A relação institucional também se desgasta: 51% dos parlamentares classificam como “ruim” o diálogo entre Executivo e Legislativo, contra 41% em 2023.

Reforma tributária enfrenta obstáculos no Congresso

A postura hostil à agenda econômica do governo deve dificultar a tramitação de outras propostas prioritárias, como a regulamentação da reforma tributária e o novo modelo de tributação sobre os mais ricos. A resistência à taxação de grandes fortunas, trusts e fundos exclusivos, embora não medida diretamente na pesquisa, pode ser inferida pelo forte alinhamento dos deputados a pautas corporativas e interesses de renda elevada. Hoje, a maioria dos deputados forma uma muralha de proteção aos mais ricos.

Parlamento dividido e cenário incerto para 2026

Apesar de a maioria (68%) acreditar que Lula será candidato à reeleição em 2026, 50% dos deputados apostam que um nome da oposição sairá vencedor. Entre os possíveis sucessores oposicionistas, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), aliado da oposição a Lula, lidera as menções espontâneas com 49%.

No plano institucional, o STF também aparece como alvo: 49% dos deputados avaliam que a Corte “sempre” invade competências do Legislativo. Por outro lado, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), mantém boa avaliação entre seus pares: 68% consideram sua gestão positiva.