A 1ª Vara Cível da Comarca do Crato condenou a Casa de Acolhimento Feminina Água Viva, localizada no bairro Mirandão, a pagar R$ 390 mil em indenizações a 34 mulheres que foram mantidas em condições degradantes e submetidas a maus-tratos dentro da instituição.
O caso veio à tona em agosto de 2021, após uma das internas escrever um bilhete denunciando abusos e entregá-lo à família durante uma visita. A denúncia levou à deflagração de uma operação policial que revelou um cenário de cárcere privado, abusos físicos, psicológicos e violações graves à dignidade das internas.
Celas, maus-tratos e trabalho forçado

As mulheres, com idades entre 30 e 90 anos, viviam em quartos trancados com portas gradeadas, que funcionavam como celas. Elas só saíam dos alojamentos para realizar tarefas forçadas, como recolher lixo, rasgar livros para reciclagem, capinar mato e até limpar fezes e urina das celas com as próprias mãos.
As condições de permanência eram definidas de acordo com a situação financeira, o quadro clínico e o nível de contato com a família, o que, segundo o processo, demonstrava um modelo de controle e isolamento seletivo. Familiares também eram impedidos de acessar determinadas áreas da clínica.
O local funcionava desde 2015 como clínica de repouso e anunciava tratamento e acolhimento a pessoas com transtornos psiquiátricos, especialmente idosas.
Indenização e proibição de atuar no setor
Na decisão, o juiz José Batista de Andrade reconheceu a prática de cárcere privado e classificou o tratamento das vítimas como “desumano” e “em violação direta à dignidade da pessoa humana”.
“A privação de liberdade, associada às condições sanitárias precárias, caracteriza grave violação aos direitos das internas, que sofreram abusos físicos e psicológicos, fome, restrição de higiene e trabalhos forçados”, afirmou o magistrado.
A sentença determina que:
- A clínica e o proprietário, Fábio Luna dos Santos, paguem R$ 50 mil por danos morais coletivos;
- Cada uma das 34 mulheres receba R$ 10 mil por danos individuais;
- Os réus estão proibidos de exercer qualquer atividade relacionada ao cuidado de pessoas com transtornos mentais por 5 anos.
Defesa alegou perseguição e irregularidade na denúncia
Em sua defesa, o proprietário negou os fatos e afirmou que o bilhete foi “fraudado”, sugerindo que a denúncia foi motivada por interesses econômicos. Ele também alegou que a restrição de visitas ocorreu apenas durante a pandemia, em cumprimento às normas da vigilância sanitária.
A Justiça, no entanto, considerou as provas reunidas — incluindo depoimentos, fotografias e o próprio bilhete da vítima — suficientes para confirmar os maus-tratos e a responsabilização dos envolvidos.