Os estados do Nordeste e do Norte do Brasil poderão sentir com mais força os efeitos do aumento global no preço do petróleo, caso a tensão militar entre Irã, Israel e Estados Unidos leve de fato ao fechamento do estreito de Ormuz — uma das principais rotas mundiais para o escoamento de petróleo. O alerta foi feito neste domingo (23) pelo presidente-executivo da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araújo.

Segundo Araújo, o impacto para os consumidores dessas regiões deve ser maior por conta de uma mudança estrutural que ocorreu no parque de refino nacional: as privatizações de refinarias promovidas durante o governo Jair Bolsonaro (PL), que reduziram a capacidade de o país controlar internamente os preços em momentos de crise no mercado internacional.

No Nordeste, por exemplo, a Petrobras hoje mantém apenas uma refinaria em operação, a Abreu e Lima, em Pernambuco. Outras refinarias importantes, como a da Bahia e a do Amazonas, foram vendidas para grupos privados nos últimos anos. Já no Norte, praticamente toda a oferta de combustíveis depende hoje de empresas privadas que operam com preços atrelados ao mercado internacional. Ou seja: qualquer aumento no preço do barril tende a ser repassado diretamente ao consumidor.

“Diferente da Petrobras, que tem tentado segurar os preços, as refinarias privadas não trabalham com defasagem — elas repassam o aumento de custo. Por isso, Norte e Nordeste, que hoje são mais dependentes dessas refinarias, sentirão o impacto primeiro”, explica Araújo.

Crise internacional pode pressionar Petrobras e elevar preços em todo o país

A preocupação do mercado aumentou depois que o Irã passou a ameaçar fechar o estreito de Ormuz em resposta aos ataques realizados pelos Estados Unidos contra instalações nucleares iranianas. O estreito é vital para o fluxo global de petróleo, com cerca de 20% do petróleo mundial passando por ali diariamente.

Com o mercado fechado no fim de semana, ainda não se sabe qual será a reação exata dos preços do barril nesta segunda-feira (24). Mas analistas já falam na possibilidade de o barril ultrapassar os 100 dólares nos próximos dias. Na sexta-feira, ele estava cotado a cerca de US$ 80.

Mesmo com o atual cenário, a Petrobras já vinha praticando preços defasados — R$ 0,50 por litro no diesel e R$ 0,20 na gasolina, segundo dados da Abicom. Se o preço internacional explodir, a estatal pode ter dificuldade de manter os valores congelados sem enfrentar pressões de seus próprios acionistas, principalmente os privados, que podem contestar a política de preço no médio prazo.

Impacto poderá refletir na inflação

Segundo o economista Bruno Imaizumi, da LCA Intelligence, o aumento no diesel — que já corresponde a 25% do consumo nacional de petróleo — pode gerar efeitos indiretos sobre diversos produtos, já que o transporte rodoviário de cargas é majoritariamente dependente do combustível. “Qualquer alta no diesel acaba se espalhando por toda a cadeia de consumo, pressionando a inflação em itens básicos”, analisa.

O cenário, portanto, é de atenção redobrada para os consumidores — especialmente nas regiões Norte e Nordeste, que hoje estão mais expostas. As privatizações promovidas no governo Bolsonaro acabaram reduzindo a capacidade do Estado de amortecer os choques externos, deixando o país mais vulnerável a oscilações como a que se desenha neste momento.