No centro da maior investigação por fraudes da história do INSS, as autorizações de descontos em folha para sindicatos e associações — que atingiram R$ 6,3 bilhões entre 2020 e 2025 — foram defendidas por parlamentares de diversos partidos quando o governo Bolsonaro tentou endurecer as regras. A apuração foi revelada pela jornalista Malu Gaspar, do jornal O Globo.
Tudo começou com a Medida Provisória 871/2019, proposta ainda na gestão Bolsonaro. O texto visava aumentar o controle sobre fraudes no INSS, exigindo, entre outras medidas, que os aposentados revalidassem anualmente as autorizações para descontos feitos por entidades sindicais. A proposta, no entanto, sofreu forte resistência no Congresso.
Parlamentares do PT, PCdoB, PSB, PDT e até de partidos do centro, como PSDB e MDB, apresentaram dezenas de emendas para flexibilizar ou barrar os controles propostos. A principal justificativa era que a MP supostamente promovia uma “perseguição contra os trabalhadores” e dificultava a “organização sindical”.
Em plenário, o deputado Carlos Veras (PT-SP), irmão do atual presidente da CONTAG — entidade que recebeu R$ 426 milhões apenas em 2023 — chegou a comemorar a “vitória da esquerda” na preservação dos descontos. No Senado, Jaques Wagner (PT-BA) também se posicionou contra as exigências de controle, defendendo o papel dos sindicatos na organização da classe trabalhadora.
O que está em jogo
A CONTAG está no centro da Operação Sem Desconto, da Polícia Federal, que investiga fraudes estruturadas com base justamente nas brechas que o Congresso optou por manter. Além de postergar a exigência de revalidação anual para 2028, parlamentares de esquerda tentaram reduzir a exigência para uma verificação a cada cinco anos.
Outra mudança importante foi a derrubada de dispositivos que proibiam sindicatos de atestar atividade rural para fins previdenciários — uma prática considerada vulnerável a fraudes e que foi mantida tanto nos governos Bolsonaro quanto Lula, mesmo após a sanção da lei.
A Controladoria-Geral da União (CGU) e o Ministério Público Federal apontam que o INSS continuou aceitando declarações frágeis para comprovação de vínculo associativo e de atividade rural, mesmo após a mudança legislativa que vedava a prática.
Desdobramentos políticos
O escândalo gerou reação imediata no Planalto, que tenta agora se desvincular da crise. No entanto, a cadeia de responsabilidades alcança também a base aliada do governo atual, que desempenhou papel central na defesa política dos mecanismos agora associados ao desvio de recursos dos aposentados.
Entre os possíveis efeitos da crise:
- Desgaste para o PT e partidos aliados, especialmente no interior do Nordeste;
- Freio em projetos de fortalecimento sindical no Congresso;
- Investigação de parlamentares próximos à CONTAG e outras entidades beneficiadas pelos repasses indevidos.
A apuração segue em curso sob responsabilidade da Polícia Federal, da CGU e do Tribunal de Contas da União, com base nos registros de autorizações frágeis, pressão política e movimentação financeira das entidades envolvidas.